sexta-feira, 13 de abril de 2007

Carta do Procurador do Trabalho
Prezado (a) Sr. (a).
Como Procurador do Trabalho que primeiro instaurou procedimento em São Paulo para investigar as condições de trabalho dos controladores de tráfego aéreo gostaria de fazer as seguintes afirmações que decorrem desse nosso trabalho desde 06/10/2006:
1. As condições de trabalho dos controladores, por incrível que possa parecer,pioraram desde o acidente;
2. Mesmo o Grupo de Trabalho criado pelo próprio governo tendo opinado peladesmilitarização, o Governo, passados mais de 40 dias, não tomou nenhuma providência;
3. O Governo conseguiu com sua inércia algo aparentemente impossível: amobilização de militares. Desde que iniciamos a investigação constatamos queeram trabalhadores dispersos, com pouca consciência de seus direitos e de queformavam uma classe e, portanto, possuem interesses comuns. Começo a surgiratos isolados de controladores: alguns mártires foram surgindo aqui e ali demaneira que isso aliado a omissão e descaso do governo fez com que o movimentocrescesse.
4. Segundo reconhece inclusive as altas autoridades da Aeronáutica oscontroladores são trabalhadores apaixonados pelo que fazem e obcecados porsegurança, situação inexistente no tráfego aéreo brasileiro infelizmente.Segundo a Organização Mundial de Saúde essa função é a 2ª em termos de estressee pressão psicológica, ficando atrás apenas da atividade policial. Oscontroladores possuem esse perfil e, por isso, são considerados no mundo todo"Os Anjos do Céu" das pessoas que estão voando. Todavia, quando se insurgem comas péssimas condições de trabalho a que estão sendo submetidos a décadas, sãoconsiderados criminosos, insubordinados e bandidos.O Governo e Aeronáutica estão conseguindo o que queriam, desviar a atenção dosproblemas estruturais do sistema e colocando a culpa do lado do mais fraco,como sói ocorrer em nossa injusta Sociedade em que a elite consegue ver suasteses abraçadas por um pacto de interesses governo, parte da mídia e outrosatores sociais interessados nesse obscurantismo.
5. O Presidente fala da irresponsabilidade dos trabalhadores por fazerem greveem serviço essencial. Duas questões:
5.1. O Governo reconhece que é essencial então porque deixou o setor a vernavios durante décadas (sem investimentos em material humano e equipamentos)
5.2. A irresponsabilidade também é do governo que não regulamentou o artigo daConstituição Federal que prevê o direito de greve do servidor público, aíincluído os serviços essenciais. No setor privado já temos essa regulamentação.Quando há greve em metrô, ônibus ou hospitais por exemplo, o sindicato tem queavisar a população e seu empregador com 72 horas de antecedência além degarantir um percentual mínimo de trabalhadores para atender as necessidadesinadiáveis da comunidade. O governo não quis que essa lei fosse aplicada aosetor público. O próprio Ministério Público do Trabalho, por diversas vezesentra com Dissídio Coletivo de Greve pedindo que seja mantido percentual alto(50, 60 ou até 70%) de trabalhadores e equipamentos funcionando para que asnecessidades da comunidade sejam atendidas.
6. A insubordinação só é assim considerada quando é feita pelos sargentos.Criticar abertamente o Presidente também é insubordinação. Quer dizer, só seinstaura IPM quando a patente é baixa. Essas autoridades visando interessespessoais transferiram trabalhadores de um lugar pra outro sem finalidadepública. O intuito era tão somente minar a sua mobilização. Isso é dinheiropúblico gasto sem finalidade coletiva.
7. O Ministério Público do Trabalho se preocupa com os interesses dos usuários eas humilhações e prejuízos que vem passado em decorrência dessa crise aérea.Todavia, partindo da premissa de que condições de trabalho inadequadas (jornadaexcessiva, ausência de descanso, carência de pessoal, trabalho em folgas,salário e nível de inglês etc.) coloca em risco a segurança aérea, continuo apreferir avião no solo do que no céu sem segurança.
8.A segurança do Sistema de Tráfego Aéreo brasileiro é muito dependente doelemento humano, haja vista as constantes falhas dos equipamentos. No entanto,esse elemento humano é o que é pior tratado dentro do sistema. Em outrospaíses, a segurança depende mais da tecnologia e dos pilotos. No entanto, ascondições de trabalho em países como França, EUA são extremamente melhores doque aqui (jornada, formação, salário, etc)Por fim, essa situação poderia ser contornada, pois afinal o Presidente daRepública é o Comandante em Chefe das Forças Armadas. Nesse sentido observa-sea utilização política para desestabilizar o governo, criando mais problemasainda.A aeronáutica não tem mais capacidade para gerenciar o sistema e ainda por cimanão ajuda na transição a qual deve ser lenta, progressiva, pois oscontroladores têm capacidade operacional, mas a parte técnica continuaria com aaeronáutica. Sinto uma pressão no sentido de: "vamos passar pra ele, eles nãoterão condições de gerir a parte técnica, então voltaremos ungidos comosalvadores".A aeronáutica é tão fechada e corporativa que não consegur enxergar além doslimites da caserna. Um dia aparecerão os motivos mesquinhos pelos quais aaeronáutica quer manter o controle de tráfego.
Cito algumas:
1. Infraero é cabide de empregos para ex e parentes de militares;
2. A ATECH empresa que fornece o X-4000 que vive dando problemas é a antiga ESCAque participou da licitação do SIVAM e foi desclassificada. Um irmão dobrigadeiro Vilarinho faz parte da Diretoria dessa ATECH;
3. O Governo brasileiro recebeu uma fortuna na década de 90 para desenvolver umsistema de monitoramento por satélites. A Europa já está implantando essesistema. Com o 11 de setembro houve uma diminuição no aumento do tráfego.Continou aumentando, mas a um ritmo menor. E o dinheiro onde foi parar.
4. A aeronáutica possui muitos pilotos e poucos aviões. Esse pessoal tem que irpra algum lugar. Manda eles pro tráfego aéreo.
5. Os militares adquirem conhecimentos no controle de tráfego e depois vão paraa iniciativa privada ganhando muito bem, exemplo, o atual Presidente daInfraero que é ex-FAB, brigadeiro José Carlos Pereira. Não há quarentena praeles.É muito fácil e cômodo fazer com que a corda arrebente do lado do mais fraco eimpedir que venha à tona as verdadeiras razões dessa crise.
Atenciosamente,
Fábio Fernandes